Bem Vindo

terça-feira, 8 de novembro de 2011

OLHAR EPISCOPAL -- EDIÇÃO 14 --- A PRIORIDADE DA ORAÇÃO

Por dom Milton Kenan Junior
No final de mais um ano é justo perguntar-se sobre as metas atingidas, as dificuldades encontradas e o caminho percorrido e a percorrer para realizar os projetos e alcançar os objetivos que nos propomos.

É importante que este trabalho se faça a nível pessoal, ou seja, que cada um tenha a capacidade, ao aproximar-se do final de mais um ano, de se perguntar: Como vivi? O que tenho buscado? Quais os meios tenho utilizado para realizar os ideais da minha vida? Mas, é tão importante que este exercício seja feito também em nível comunitário, que cada comunidade se interrogue sobre sua caminhada, os objetivos pastorais que definiu e como os têm alcançado, os meios que utiliza para cumprir a sua missão etc.

Nesse sentido, será importante que nós nos interroguemos sobre as nossas motivações, ou seja, os princípios que norteiam nossa vida e nossa ação.

Dentro dessa perspectiva, penso que será oportuno nos perguntarmos sobre a qualidade de nosso relacionamento com Deus e, por consequência, de nossa oração.

No início do novo milênio, o Beato João Paulo II, na sua “Carta Novo Millennio Ineunte” (No início do Novo Milênio) propunha à Igreja no limiar do novo milênio a “pedagogia da santidade”, como também falou da “arte da oração”. Assim se expressava o Beato João Paulo II: “Não será porventura um ‘sinal dos tempos’ que se verifique hoje, não obstante os vastos processos de secularização, uma generalizada exigência de espiritualidade, que em grande parte se exprime precisamente numa renovada carência de oração?” (n. 33).

Mais adiante, na mesma carta, o Beato João Paulo II diz que se não se considera o primado da graça, a necessidade da oração, “não nos podemos maravilhar se os projetos pastorais se destinam a falir e deixam na alma um deprimente sentido de frustração. Repete-se então conosco aquela experiência dos discípulos narrada no episódio evangélico da pesca milagrosa: ‘Trabalhamos durante toda a noite e nada apanhamos’ (Lc 5,5). Esse é o momento da fé, da oração, do diálogo com Deus, para abrir o coração à onda da graça e deixar a palavra de Cristo passar por nós com toda a sua força: Duc in altum!” (n.38).

Como se vê, o que dá sustentação e garante a “eficácia” de nossas iniciativas não são apenas os projetos que elaboramos, os recursos que dispomos, os meios que utilizamos, mas, sobretudo, o tempo que dedicamos à oração, à escuta da Palavra, a meditação que fazemos do Evangelho e sua aplicação na nossa vida.

Hoje, certamente para muitos, Jesus continua a fazer a mesma censura que fez a Marta que o hospedara em sua casa: “Marta, Marta, andas muito inquieta e te preocupas com muitas coisas; no entanto, uma só coisa é necessária; Maria escolheu a boa parte, que lhe não será tirada”. (Lc 10, 41-42)

O que fez Maria? O que ela escolheu? Escolheu permanecer aos pés do Mestre, escutando-o, deixando-se iluminar pela sua Palavra, para a partir daí dedicar-se de corpo e alma aos seus afazeres.

Semelhante foi também a experiência dos discípulos de Emaús (cf. Lc 24,13-35). Retornavam transtornados de Jerusalém; estavam aflitos, abatidos, frustrados e cansados. Bastou o Senhor aproximar-se deles e dirigir-lhes sua Palavra e seus corações ardiam e, reconhecendo Jesus no partir do pão, voltaram às pressas a Jerusalém, para anunciar aos apóstolos a alegria do encontro com Jesus Ressuscitado!

O Beato Papa João Paulo II ainda na Carta “Novo Millennio Ineunte”, observa: “Mas a oração, como bem sabemos, não se pode dar por suposta; é necessário aprender a rezar, voltando sempre de novo a conhecer essa arte dos próprios lábios do divino Mestre, como os primeiros discípulos: ‘Senhor, ensina-nos a orar’ (Lc 11,1). Na oração, desenrola-se aquele diálogo com Jesus que faz de nós seus amigos íntimos: ‘Permanecei em mim e eu permanecerei em vós’ (Jo 15,4). Essa reciprocidade constitui precisamente a substância, a alma da vida cristã, e é condição de toda a vida pastoral autêntica.” (n. 32).

Precisamos hoje aprender a “não dar por suposta” a oração, ou seja, convencer-nos que é sempre necessário aprender a rezar. Por mais que tenhamos avançado no caminho da intimidade com Deus, por mais que estejamos em contato com a Palavra de Deus, com os Sacramentos, a vida litúrgica e o ensinamento da Igreja, precisamos nos convencer que somos sempre aprendizes na oração; precisamos sempre reservar tempo, servir-se de uma boa leitura, dedicar-nos a oração silenciosa diante do Sacrário, para podermos fazer a experiência do encontro com o Senhor que fala no silêncio do coração.

Santa Teresa de Ávila, Doutora da Igreja nos caminhos da oração, afirmava: “Quando o coração reza, Deus atende!”. Desta afirmação se aprende que é preciso rezar com o coração, ou melhor, levar o coração à oração para que nossa oração seja autêntica e corresponda aos desígnios de Deus. Os salmistas são depois de Jesus os que melhor expressam isso para nós: diante de Deus não escondem suas aflições, suas lutas, sua pobreza e miséria, sua esperança ilimitada. Rezam o que vivem, e vivem o que rezam! Na oração, deixam o coração extravasar diante de Deus!

Diante da tentação daqueles que afirmam que a vida é oração, devemos responder que sem oração a vida se esvazia, e a fé se enfraquece; tudo seu reduz ao próprio esforço, correndo o risco de fazer só o que convém, deixando pouca margem à ação de Deus e a aceitação da Sua Vontade!

Nos nossos projetos pessoais e programas pastorais não subestimemos a oração! Ao contrário, façamos dela prioridade e não tenhamos medo de nos lançar numa verdadeira pastoral da oração. A oração não resolve de imediato nossos problemas, mas nos dá força e serenidade para enfrentá-los! A oração não se contabiliza, mas permite olhar a nossa vida com um novo olhar, o olhar de Deus que não se cansa de nos esperar, para dar-nos a luz e a alegria necessárias para avançarmos e alcançarmos novas metas e atingirmos nossos ideais.

Dom Milton Kenan Junior
Bispo Auxiliar de São Paulo
Vigário Episcopal para a Região Brasilândia

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